8.3.11
Os Jovens e o Momento Presente
Interrompo hoje demorada ausência neste fórum, para me referir à anunciada manifestação de jovens no próximo Sábado, dia 12 de Março de 2011, praticamente 37 anos depois da sempre invocada Revolução de 25 de Abril do já longínquo ano de 1974, quando tudo nos parecia risonho.
Pouco a pouco temos perdido todas as ilusões de então e já quase só retemos a pretensão de um regime democrático, na sua essência política, porque, na vertente económica, se instalou uma situação muito mais perversa que a conhecida de antes daquela data revolucionária.
Como muitas vezes aqui repeti, desde 2004, quando comecei a exprimir opiniões políticas neste espaço, existem no presente iguais ou eventualmente até maiores motivos de indignação dos cidadãos, que os tão repisados queixumes e diatribes da velha guarda «anti-fascista» contra o regime derrubado em 1974.
Do ponto de vista económico, creio já não restar dúvida a ninguém, pelo menos a quem não se mova politicamente por mera inclinação ideológica, com a agravante de hoje se reclamar contra um Poder que se proclama democrático, quando já nem formalmente assim se nos afigura.
Tomado por castas sucessivas de mandantes de coloridos políticos supostamente diversos, mas, no essencial, semelhantes, i.e., no açambarcamento da representação política e na distribuição de benesses, a coberto da legitimidade eleitoral, o presente regime cavou o seu indesfarçável descrédito.
Acresce que, neste ponto do domínio da representação política, o Partido dito Socialista excede tudo o que outros antes praticaram e, com a ascensão de Sócrates, o despudor da ocupação do Estado, por nomeação política, tornou-se desmedido, na exacta dimensão da falta de ética do actual Secretário-Geral do dito Partido Socialista, que tem sido levado às costas por enorme compadrio dos agentes da Comunicação Social, os mesmos que, nos anos finais do Cavaquismo, arrepelavam cabelo e carnes contra os abusos da governamentalização da sociedade portuguesa por parte do PSD.
Logo que se deu a entrada em cena governativa do «Socialismo», pela mão do facundo Guterres, tão eloquente quanto demagogo, inconsistente e tíbio na acção, houve como que uma anestesia geral da Comunicação que levou anos a ganhar alguma objectividade analítica e, só muito recentemente, depois do descalabro socretino, parece finalmente desperta para tanta vigarice política, de funestas consequências económicas e sociais.
Depois de se terem instalado maciçamente no aparelho de Estado, nos organismos públicos, nas Fundações, nos Gabinetes Sociais, nas Universidades Públicas e Particulares, em Bancos públicos e privados e até, pasme-se, em Empresas criadas e conduzidas por iniciativa de particulares, os vastos tentáculos socretinos, ei-los que gritam agora aos quatro ventos a proximidade da falência do Estado e a responsabilidade dos seus adversários na iminente desgraça.
Custa a crer que a sem-vergonha haja subido tão alto.
Como corolário da delapidação dos magros recursos do Estado, incapaz de sustentar tão larga família parasitária, surge uma geração desesperada pela falta de perspectivas da sua vida presente e futura.
Confiados nos seus diplomas universitários, muitos deles, reconheça-se, da maior fragilidade, pela fraca credibilidade das instituições em que foram obtidos, também aqui, em grande parte, por incúria do Poder Político, que autorizou prodigamente a abertura de Universidades privadas, sem se preocupar com a qualidade do Ensino aí praticado, sem ter fiscalizado, como lhe competia, o seu funcionamento pedagógico e administrativo, sentem-se agora estes jovens profundamente ludibriados, atirados para ocupações de recurso, mal pagas e sem contratos que lhes assegurem um mínimo de conforto e dignidade nas suas vidas.
Como alternativa, resta-lhes o voto com os pés, expressão que os velhos «anti-fascistas» gostavam de utilizar para caracterizar a forte corrente migratória dos anos 60 do século passado, já prestes a ser igualada, se não superada, não fora o menor crescimento económico dos países tradicionalmente elegidos pelos portugueses para emigrarem.
Se por um lado devemos saudar a afirmação de consciência cívica por parte destes jovens, por outro, deveremos lembrar-lhes que todas as gerações tiverem de enfrentar as suas dificuldades típicas do momento em que entraram no Mercado de Trabalho.
Pode discutir-se a questão da maior ou menor dificuldade das situações que cada geração houve de arrostar, sendo certo que, para quem se encontra à beira do desespero actual, o consolo de ouvir os mais velhos falarem dos maiores obstáculos que, no seu caso, acharam pela frente, será sempre de escasso ou de nulo efeito.
Ainda assim, convém lembrar que os jovens do início dos anos 70 tinham diante dos olhos o espectro de uma Guerra em África, lá longe, sem empregos antes de cumprirem o serviço militar, então obrigatório e de, em regra, 48 meses, de onde se regressava, os que regressavam, sem garantias nenhumas de emprego, sem nenhuma solidariedade manifestada pelo Estado ou pelos particulares, sem qualquer recompensa por terem participado num esforço combatente imposto pelo Estado como indiscutível, tudo isso configurando uma realidade bem dura, que nada perde em crueldade comparada com a que hoje as novas gerações estão vivendo.
Só o idealismo então prevalecente contribuia para suavizar a dureza da situação e aqui reside, a meu ver, a diferença capital : havia nesse tempo clara esperança em dias melhores.
Para uns seria o Socialismo, sistema político-económico que superaria as deficiências do Capitalismo.
Para outros, ela estaria no próprio Capitalismo, suavizado, na sua natureza amoral, pela Social-Democracia actuante, que havia criado sociedades de abundância económica, de conforto social, de dinamismo científico, tecnológico e cultural, em ambiente de plena tolerância política, religiosa e moral, como nunca se havia conhecido na Europa ou em qualquer outra parte do Mundo.
Por se ter perdido esta perspectiva de reforma progressiva, de sentido melhorista, é que nos achamos hoje em piores circunstâncias e daí que se seja nosso dever compreender, animar e ajudar as novas gerações, incentivá-las a encontrar o seu caminho, acreditando nas suas capacidades, no seu senso ético, na sua responsabilidade em modificar o que está mal edificado, mal concebido e mal orientado, para servir a Humanidade, que, na sua aventura terrena, não o esqueçamos, deve lutar para ser feliz, para alcançar o seu quinhão de felicidade compatível com as limitações do planeta e com o dever de solidariedade geral para com o seu semelhante.
Aqueles que não se revêem nos actuais Partidos Políticos, se não estão dispostos a lutar dentro deles para a sua transformação em organizações mais sãs e socialmente mais eficazes, devem ousar criar novas estruturas de intervenção política e social, abandonando pretensões quiméricas a esquemas e manhas de salvação egoístas, que não resolvem nada de fundo, nem de duradouro.
Cumpre no entanto que estejam vigilantes para não embarcarem em utopias historicamente falhadas, amplamente demonstrado o seu embuste, pelo sacrifício de milhões de seres humanos, muitos deles sinceramente crentes nesses supostos ideais salvíficos, na verdade, perversamente iludidos, de que a custo se livraram, no final do século XX.
Refiro-me evidentemente à utopia socialista-comunista de inspiração marxista-leninista, que teve na antiga URSS a sua máxima expressão de esperança defraudada, ao fim de 74 anos de enorme restrição de liberdade individual, de pobreza generalizada, a troco de uma suposta fortaleza militar, no final, improdutiva, corrupta e que se revelou incapaz de assegurar a própria coesão do Estado que a ergueu.
Tudo isto é História do século XX, que, no entanto, cumpre conhecer, ter sempre presente, para evitar novas desilusões, novos desastres, tanto quanto a Humanidade pode precaver-se no seu incerto devir.
AV_Lisboa, 08 de Março de 2011